domingo, 28 de junho de 2009

07/10/04



Olhou para trás e viu que ninguém a mais a seguia. Nada mais a perseguia. Lembrou-se das surras que levava do pai. Certa vez até lhe quebrara um braço. Lembrou-se dos abusos do irmão. Quando chegava bêbado em casa e lhe levantava o vestido, pondo-se sobre ela e resfolegando feito um animal. Recordou-se da mãe. Boa criatura. Morreu no rio. Mas ela tinha certeza que a mãe não “havia morrido” e sim “fora morta” lá. Encontrou seu corpo boiando, de olhos abertos, e chorou. Chorou como nunca havia chorado antes, pois morrera a única pessoa em quem podia confiar. A única que amava. Deve ter passado meia hora lá em cima, parada, pensando nisso tudo. Não sabia as horas. Não sabia ler. Não sabia sorrir. Era tudo tão bonito ali que lhe faltava o ar. Abriu os braços. Sentia-se livre, embora não soubesse o que aquilo significava. O vento batia no seu rosto, cada vez mais rápido. Cabelos, vestido, tudo voava. E ela também. Até que, de repente, tudo parou. Uma porta se abriu. E uma luz, que quase a cegava, lhe iluminou o caminho.